30 de jun. de 2008

Clube da Esquina

"Porque se chamavam Homens.
Também se chamavam Sonhos.


E Sonhos Não Envelhecem."



22 de jun. de 2008

"Cortesia em crise", por Walcyr Carrasco

Mamãe defendia regras sólidas de educação. Em uma visita, se a dona da casa oferecesse café com bolo, não podia comer muito.

– Experimente só um pedacinho! – avisava mamãe.

Eu ficava de olho espichado para o doce enquanto a dona da casa insistia:

– Quer mais?

– Não, obrigado.

– Não gostou?

– Gostei, sim senhora!

Sentia o olhar materno faiscando. Aceitava mais um. Depois ouvia:

– Ela vai achar que você é fominha!

Havia regras excessivas. Mas hoje tenho a impressão de que boa parte das pessoas não aprendeu uma sequer. É comum estar conversando quando toca o celular da outra pessoa. Ela inicia um longo papo. Permaneço com cara de paisagem, enquanto a pessoa fala, fala, fala! Acho uma tremenda falta de gentileza.

Outra questão é a do horário em espetáculos. Muita gente acha normal atrasar. O ator Antônio Fagundes proíbe o ingresso depois das portas fechadas. Há quem fique revoltadíssimo. E quem foi pontual é obrigado a suportar o barulho do relapso entrando e procurando o lugar no escuro? Há algum tempo dei uma palestra em uma grande universidade. Durante todo o tempo os alunos entravam e saíam, batiam a porta, faziam barulho. E me desconcentraram totalmente. Pensei: "Que falta de educação! E são universitários!". Na palestra seguinte, impus duas condições: atrasados não entravam, quem saísse não voltava. Virei o "chato". Ótimo. Melhor ser chato do que mandar flores e não receber nem um telefonema de agradecimento, como sempre me acontece. Já cansei de enviar buquês, bombons, panetones e não merecer nem um alô. Sou tonto. Imaginava alguma falha na entrega. Perguntava se a pessoa havia recebido, para ouvir:

– Ah, é, obrigado.

E o inconveniente que vê duas outras conversando? Senta-se na mesa e começa:

– Lembra-se de mim?

Não pergunta se está interrompendo. Desfia a própria biografia sem pausa para respirar. Finalmente, levanta-se:

– Estou indo. Vocês estão bem, não estão? Até mais.

Parte após ter devorado o couvert!

Atores e produtores muitas vezes me encomendam peças teatrais. No início eu me entusiasmava. Agora só me sento ao computador se houver insistência. Muitos nunca mais tocam no assunto, mesmo que eu tenha trabalhado semanas em uma idéia. Já trabalhei como doido até em fim de semana para depois ouvir:

– Ainda não tive tempo de ler!

Em outras áreas, também vi vários casos de pessoas que dão o toque para um trabalho, o outro se entusiasma e às vezes não recebe nem um telefonema de volta. No cotidiano, a falta de educação é a regra: as pessoas furam fila descaradamente, deixam a porta do elevador fechar no meu nariz, não respondem a um "boa tarde" quando me sento no avião a seu lado. As boas maneiras têm sido esquecidas até no que se refere à vida financeira. Já emprestei dinheiro a amigos que não me pagam nem nunca mais fazem referência ao assunto. Fico sem jeito em falar de grana, mas acabo dando um toque tímido. E já ouvi:

– Não paguei porque você não está precisando.

Pode haver maior falta de cortesia? Não honra o compromisso e ainda dá a entender que nem tenho o direito de receber, como se eu fosse um pão-duro ávido por cada centavo? Reajo:

– Pensei que era um empréstimo, não um projeto de justiça social.

O devedor fica mal-humorado e pára de falar comigo. É o cúmulo! Não é preciso ser formal, exagerado. Mas seria bem mais agradável ter de volta um pouco da antiga cortesia, e que as pessoas redescobrissem o valor da gentileza.


e-mail: walcyr@abril.com.br

Batalha das Toninhas: a participação do Brasil na 1º Guerra Mundial - aula do prof. Carlão

20 de jun. de 2008

1994, o ano que mal começou

Aquele triunfo fez muito mal às nossas artes ludopédicas; foi ali, naquela vitória, que o Brasil inventou o dunguismo.
Por Xico Sá


AMIGO TORCEDOR, amigo secador, se 1968 não findou ainda para a história, 1994 é o ano que não acabou para o futebol brasileiro. Nunca um triunfo fez tanto mal às nossas artes ludopédicas.

Tudo bem, você vai dizer que o título veio em boa hora, que atravessávamos jejum digno da quarentena de Jesus no deserto, mas, amigo, foi ali, com heróica vitória nos pênaltis, que o Brasil inventou o dunguismo.

Daquele momento por diante, o brasileiro, pusilânime e carente como prostituta do interior na Sexta-Feira Santa, abriu mão da sua maior virtude: ganhar ou perder jogando bonito. Era uma cláusula sagrada do contrato social do escrete com o populacho. Podia faltar pão na mesa, mas o circo era garantido como se vivêssemos sob ordens do imperador Júlio César na Roma Antiga: "Ad populum panis et circensis".

Falo de contrato pescando aqui o colega Rodrigo Bueno e a sua belíssima crônica sobre o time idem da Holanda. Sim, amigo, lá, o técnico firma em cartório o dever cívico de encher os olhos do público.

Como bem disse José Mourinho, gajo que manja do babado, abrir mão do nosso jogo é, além de burrice, enterrar grande traço cultural e particularíssimo da civilização brasileira. O pior é que o dunguismo, doença infantil do teixeirismo, regime perpétuo da ex-CBD, além de jogar mais feio do que briga de foice no escuro, também não ganha mais nem do Caveirinha Futebol Clube, citando um 11 clássico formado por trabalhadores de funerárias e cemitérios da invicta e gloriosa Recife.

Não, amigo, não é pegar pesado, ou "pessado", como nas piadas em portunhol sobre os argentinos, mas que maçada esses pebolins ou totós humanos que estamos vendo.

Se isso é futebol, eu me chamo Jorge Luis Borges, Adolfo Bioy Casares, Macedonio Fernández, Washington Cucurto, para citar só gênios da escrita do país de Maradona. Na buena onda, nem sou de me irritar ou celebrar feitos canarinhos.

Sempre achei que futebol de seleção e de Copa são para amadores e para quem não aprecia, à vera, a lúdica e grandiosa literatura feita com os pés, a melhor das brincadeiras humanas. Mas o dunguismo é capaz de tirar do sério até o dalai-lama, até Maria do Socorro, minha santa madre, que só vê jogos do ex-escrete.

Certo está o Marcelo, basco-paulista-nordestino, amigo rock n" roll do ABC, que trocou o dunguismo pelo já tradicional desfile de lingeries do programa da Luciana Gimenez. Que alívio mudar de canal nessa hora. Ufa! Eu limpei a vista com a deliciosa pantaneira Juma Marruá, além de passar no "Todo Seu", do genial Ronnie Von, o príncipe.

O duro foi encontrar o Magrão na seqüência, o doutor Sócrates Brasileiro, lá no "Cartão Verde". Inevitável lembrar do fino da bola. Fiquei saudoso como um português numa gare se despedindo de um parente que vai passar apenas uma semana na Europa, como eles chamavam outrora o resto do próprio continente. Até o Vitor Birner, o nosso Ballack, colega da mesma bancada, que também prefere futebol de clube, principalmente nas cores vermelho, branca e preta, estava inconsolável.

Fica Dunga, só assim tiramos uma bela soneca em berço esplêndido e esquecemos de vez este lábaro que ostentas estrelado!

xico.folha@uol.com.br